segunda-feira, 19 de novembro de 2012

Casamentos e paixões

Discutir relação nada! Tem é que apoiar incondicionalmente!


Li a crônica do bom jornalista Clovis Rossi em que ele, desiludido, decepcionado, declara o fim do seu casamento. Faz-se constar para uma possível posterioridade que hoje é o day after do rebaixamento do Palmeiras para a segunda divisão do futebol brasileiro. Uma nação verde se enluta. Clovis Rossi, um nacional dela, anuncia o fim do seu casamento com o Palmeiras. A desilusão é flagrante. Poucos homens assumem publicamente o fim de um casamento e – mais! – revelam traições. Clovis Rossi fez isso. Está arrasado.
Compreensível sua dor. Não sou casado, mas tenho muitíssimos amigos casados. Uns muito bem, outros nem tanto. Outros já passaram pela dor que o jornalista passou, mas foram mais reservados. Outros jogaram a coisa no ventilador e o fim do casamento virou um circo de horrores. Coisa dantesca. Talvez por ser jornalista, melhor, por não se referir a uma mulher, Clovis Rossi consegue dar certo lirismo a uma situação triste. Todos aqueles que manejam bem as palavras fazem da tristeza poesia. Talvez por nunca prescindirem, em momento algum, da paixão, do sentimento.
No fim das contas, tudo é isso mesmo. Paixão. Mais que isso, amor. Qualquer relacionamento não pode abrir mão de doses certas desses elementos. Casamentos, sejam quais forem, muito menos. Assim as coisas andam. Onde estiver envolvida nossa paixão, nosso fogo estaremos nos dedicando. Repito: Não sou casado, mas conheço amigos casados. Uns muito bem casados e a fórmula que sustenta esses felizes matrimônios termina sendo a mesma.
Nenhum casamento é uma eterna lua-de-mel. A qualquer momento, uma corda pode estourar, um pedaço pode cair, uma parte pode fraquejar. Relacionamento nenhum está imune a maus momentos. Pelo menos, os relacionamentos verdadeiros. Sempre haverá aquele momento de dúvida, aquele ciúme, a falta de grana pra pagar a conta de luz ou pra comprar carne. Vem a necessidade de apertar o cinto e se não houver mais buracos, que se segure as calças. Sempre alguém não estará bem. Ela estará naqueles dias e ele votará do trabalho com a cabeça cheia. Ela, fisiologicamente alterada, vai deixar o arroz queimar e dizer que não é mais amada. Ele, psicologicamente estressado, vai deixar escapar que ela engordou e que as coisas não são mais como antes. Verdades incômodas e desnecessárias. Vem a discussão, vem o momento de reflexão, o questionamento se vale a pena seguir adiante, a autoajuda, “onde estou errando?”, vem mil coisas. Mas algo vai fazer vencer todos esses questionamentos: a paixão. Mais, o amor.
Depois de breve vacilo em que se quer jogar tudo pro alto, a fita volta na cabeça. O dia em que se conheceram, os primeiros olhares, as primeiras palavras e a empatia. Vem o primeiro beijo, a primeira alegria e, por fim, o dia em que se achou que seria para sempre. Vem o dia do casamento, o juramento para o padre. Pausa para a lua de mel, aquela alegria que parece sem fim. A primeira dificuldade e o cônjuge ao lado. Depois a segunda, a terceira, a última e a fita chega ao fim. Há mais o que acontecer. Vale a pena que aconteça? Se depois do filme todo o amor existe, o casamento continua e aquilo é apenas um mau episódio. E estamos falando de casamentos interpessoais. E os casamentos figurados como o terminado pelo Clovis Rossi?
Apesar das peculiaridades não diferem em nada. Quando escolhi meu time, o namoro não começou nada bem. Foram anos sem alegria absolutamente nenhuma. Pelo contrário. Alegria, nesse começo, era sofrer pouco. Segurei firme as pontas. Não seria honesto terminar. A situação não melhorava. Outros casamentos prosperavam e o meu nada. Quase vinte anos de muito pesar. Foi quando o jogo começou a virar. Meu time passou a me dar uma alegria aqui outra lá. Começava, finalmente, valer a pena essa casamento. Não foi um mar de rosas. Mas eu não trocaria. Não terminaria por nada. Afinal, o futebol, como as relações, nasce de empatia e vive de paixão. Permite eventuais adultérios desde que se assumam adultérios para todos os envolvidos. Já quis bem algum outro time eventualmente, mas deixando claro que jamais trocaria o meu por ele. Era uma noite e nada mais. E vamos eu e meu time chegando aos trinta anos de relacionamento. Sou casado? Pode ser. Retiro o que escrevi antes
Por isso, meu caro Clovis Rossi, malgrado o respeito que lhe guardo enquanto jornalista e tendo ideia de como é a dor de ver seu time tão mal, numa situação tão lastimável que o empurra ao andar de baixo atrevo-me a aconselhá-lo que nem mesmo um rebaixamento (muito menos mais um) pode ter força o bastante pra romper seu casamento. Concluo, como quem vê de fora (e normalmente são os que veem com mais lucidez a situação toda), que não houve amor entre você e o Palmeiras, mas uma paixão provisória que durou todo esse tempo. Uma hora acabaria como acabou. Mas vida que segue. Ainda há tempo para viver um novo amor. Apaixone-se, deixe-se seduzir por algum time. Pode ser pelo Palmeiras mesmo. Quem sabe, na dificuldade de agora que as coisas não se resolvem? Basta se permitir que aconteça. Mas nunca se esqueça disso. Casamentos não são felizes o tempo todo. Muito menos o com nosso time do coração.

Francisco Libânio,
19/11/12, 11:24 PM

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