sexta-feira, 7 de maio de 2010

O Cíclope

Menino chegou em casa com uma cara um terço assustada, um terço impressionada e um terço feliz. Não conseguiu segurar e foi falar com sua mãe:

- Mamãe, acabei de ver um ciclope vendo revista de mulher pelada e fumando charuto!

A mãe quebrou o prato que lavava:

- Que história é essa, Pedro Augusto?

- É, sim, mamãe. Ele até me mostrou a revista. Era de uma loira altona, cabelo liso, peitão...

Um croque materno fez com que o menino cessasse a descrição. Onde já se viu?

- Deixa de conversa, Pedro Augusto! Ciclopes não existem. Como um ia ler uma revista de mulher pelada? Onde você viu isso?

- Na despensa, lá fora, mamãe.

Agora foi. A história toda se deu na casa, no sacrossanto lar dessa pacata família avessa a mitologias. A mãe recobrou a calma. Não podia desfazer assim da fantasia do filho. Mas precisou explicar que para tudo havia hora. Serenados os ânimos, a história caiu no esquecimento e a mãe, a fim de incutir responsabilidades no filho, mandou-o fazer algumas compras na mercearia. Ele comprou e devia guardá-las. Na volta, o menino conta:

- Mamãe, agora o ciclope estava lendo outra revista de mulher pelada e tomando cerveja!

Outra vez? Esse menino estava passando dos limites! Decidiu que ele não ia mais ver televisão até tarde. Nem com os pais. Ela tentou ser uma mãe moderna, mas é preciso impor limites ou esse garoto passaria por mentiroso. Ou por maluco. Mandou o menino fazer o dever de casa e não queria mais ouvir falar nisso.

E até a noite, já com o pai em casa, não se falou mais em ciclope. Pôs o menino para dormir quando depois do beijo de boa noite, ele perguntou:

- Mamãe, e o ciclope?

- Dorme, Pedro Augusto!

A mulher foi pra cama matutando. Resolveria as visões do filho no dia seguinte enquanto ele estivesse na escola. E assim fez. Saiu e foi contar para um amigo o caso todo.

- E o senhor acha isso certo? Me responda!

- Olha, dona Maura, o menino precisa aprender as coisas da vida.

- Mas ele tem só oito anos! Assim ele fica assustado e aprende as coisas de forma errada. Agradeço sua preocupação com a educação do garoto, mas dessa parte cuido eu, tá bom?

- Desculpe, a senhora tem razão.

- Então, que isso não se repita.

- Pode deixar, desculpe mais uma vez.

Ela ia saindo quando se lembrou de algo:

- E tem mais uma coisa!

- O quê?

- Que o senhor veja as revistas do meu marido, tudo bem, eu não me importo. Mas quando quiser beber cerveja, peça antes. Odeio gente bêbada. Agora, se eu pegá-lo fumando esses charutos fedorentos outra vez, eu me esqueço que o senhor tem dois metros e meio de altura e força sobre-humana e furo esse seu olho, está me ouvindo?


Francisco Libânio,

17/04/10, 6:51 PM


Arte de Leonardo Tadeu Serafim




Um comentário:

Emilene Lopes disse...

Interessante...rsrs
Bjs Francisco!
Mila