sexta-feira, 3 de junho de 2011

Aquele Homem


Ela me olhou com grande censura e, incisiva, decretou:
- Ou esse homem some da nossa vida e daqui ou sumo eu! Não agüento mais isso.
Minha esposa tinha razão para não agüentar. Nosso locatário da casa dos fundos era uma pessoa absolutamente inapropriada e inoportuna. E mesmo nossas casas sendo separadas por uma mureta que dava no portão do corredor, ele sempre extrapolava seu espaço e vinha nos aborrecer. Era um exibicionista. Não era um homem bonito nem tinha corpo arrumado, mas adorava andar sem camisa, exibindo o peito cabeludo ou se sentar na mureta de sunga. Uma cena deplorável que enfurecia minha esposa. E pior, cantava ela na minha frente. Pior ainda! O sujeito ainda me cantava sem pudor nenhum. E certo que ia me ganhar.
Sobre minha esposa, eu sei que ela não cederia. É uma mulher fiel e não seria um tipo desses que se interporia entre nós. Mas comigo, meu Deus, um homem! Como eu caio nesse canto de sereia? Eu tenho certeza absoluta do que gosto. Tenho minha orientação sexual definida e consciente, mas confesso que esse cara... Esse cara mexia comigo! E isso me deixava em frangalhos. Eu com minha esposa, relação estável, nove anos de união e considerando ter um filho para me deparar com um homem? Ela tinha razão em não agüentar, mas pedi ajuda:
- Você vai comigo falar com ele.
- Eu? Se ficar cara a cara com esse porco, encho ele de porrada, perco a razão. Você me conhece. Então vai lá e resolve isso!
Que parada! Agora era eu e ele. Eu o maldito parecia adivinhar que era eu quem iria falar com ele. Parecia me esperar. Cheguei à mureta e lá estava ele com uma bermuda vermelha realçando o conteúdo, óculos escuros, pose de gostoso e o indefectível peito cabeludo. Ao me ver, o sem-vergonha não se fez de rogado:
- Sabia que você não ia resistir. Entra, meu amor!
Meu amor? Mas esse infeliz estava além do cúmulo da liberdade. Usei de toda distância com ele, mas não adiantou. Tudo o que eu dizia era mote para um cortejo, uma cantada. A cada investida, eu balançava, pensava na minha esposa, em tudo o que vivemos, mas tudo morria naquele homem. E o tal partiu para um ataque incisivo. Primeiro, passava a mão nas minhas pernas, depois passou os braços atrás de mim e me puxou junto a ele. . Tentei me desvencilhar, mas também não queria resistir. Uma luta de quereres que, quando ele beijou minha nuca, foi definida. Era minha rendição. Era homem, dane-se! Eu adoro beijo na nuca. Minha esposa vive me beijando a nuca. Eu estava entregue. Pegamo-nos num beijo. Minhas mãos percorriam aquele corpo com desejo, com apetite. Eu pensava: Meu Deus, eu estou me entregando a um homem, como posso?! Mas era tarde. Por mais que eu me lembrasse da minha esposa, o fogo por esse homem me consumia. Eu não queria parar. Ele me despiu na sala. O que eu tinha a dizer? Não lembrava. Estávamos num momento tão bom que ficou melhor quando ele me chamou para o quarto. Ali eu estava refém dele, daqueles braços flácidos, mas viris. Ele me dominava e me deitou dizendo que ia me possuir. Eu estava entregue. Ele mandava, era senhor. Como seria bom ter essa torridez com minha esposa. Minha esposa?! Meu Deus, ela não quer esse homem aqui! Praticamente me fez optar ou ele ou ela! E agora eu estava com esse homem que ela não suportava. Eram nove anos. Era muito mais do que sexo. O sexo com minha esposa era bom, mas com esse homem... Prometia ser indescritível. De repente, o bom-senso me chamou à luz. Eram nove anos e uma esposa... Não dava! Empurrei o homem. Mesmo que eu quisesse não podia. Era minha esposa, tudo! Gritei com ele:
- Não posso! Não vou! Vai você! Quero você fora dessa casa amanhã pela manhã! Não precisa pagar nada! Apenas suma e deixe minha esposa e eu em paz! – e saí correndo deixando o homem sem ação. Dei um tempo e vi que ele arrumava malas. Aceitou sair numa boa. Quando minha esposa chegou, contei como tirei ele de casa. Lamentamos o tempo sem aluguel, mas isso se resolveria. Ela me deu um beijo e disse:
- Sabia que eu podia contar com você, Elisa!
- Sempre poderá, Márcia.
E fomos cuidar de outras coisas.

Francisco Libânio,
30/05/11, 12:40 PM

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