Discutir relação nada! Tem é que apoiar incondicionalmente!
Li a crônica do bom jornalista Clovis Rossi em que ele,
desiludido, decepcionado, declara o fim do seu casamento. Faz-se constar para
uma possível posterioridade que hoje é o day
after do rebaixamento do Palmeiras para a segunda divisão do futebol
brasileiro. Uma nação verde se enluta. Clovis Rossi, um nacional dela, anuncia
o fim do seu casamento com o Palmeiras. A desilusão é flagrante. Poucos homens
assumem publicamente o fim de um casamento e – mais! – revelam traições. Clovis
Rossi fez isso. Está arrasado.
Compreensível sua dor. Não sou casado, mas tenho muitíssimos
amigos casados. Uns muito bem, outros nem tanto. Outros já passaram pela dor
que o jornalista passou, mas foram mais reservados. Outros jogaram a coisa no
ventilador e o fim do casamento virou um circo de horrores. Coisa dantesca.
Talvez por ser jornalista, melhor, por não se referir a uma mulher, Clovis
Rossi consegue dar certo lirismo a uma situação triste. Todos aqueles que
manejam bem as palavras fazem da tristeza poesia. Talvez por nunca
prescindirem, em momento algum, da paixão, do sentimento.
No fim das contas, tudo é isso mesmo. Paixão. Mais que isso,
amor. Qualquer relacionamento não pode abrir mão de doses certas desses elementos.
Casamentos, sejam quais forem, muito menos. Assim as coisas andam. Onde estiver
envolvida nossa paixão, nosso fogo estaremos nos dedicando. Repito: Não sou
casado, mas conheço amigos casados. Uns muito bem casados e a fórmula que
sustenta esses felizes matrimônios termina sendo a mesma.
Nenhum casamento é uma eterna lua-de-mel. A qualquer
momento, uma corda pode estourar, um pedaço pode cair, uma parte pode
fraquejar. Relacionamento nenhum está imune a maus momentos. Pelo menos, os
relacionamentos verdadeiros. Sempre haverá aquele momento de dúvida, aquele
ciúme, a falta de grana pra pagar a conta de luz ou pra comprar carne. Vem a
necessidade de apertar o cinto e se não houver mais buracos, que se segure as
calças. Sempre alguém não estará bem. Ela estará naqueles dias e ele votará do
trabalho com a cabeça cheia. Ela, fisiologicamente alterada, vai deixar o arroz
queimar e dizer que não é mais amada. Ele, psicologicamente estressado, vai deixar
escapar que ela engordou e que as coisas não são mais como antes. Verdades
incômodas e desnecessárias. Vem a discussão, vem o momento de reflexão, o
questionamento se vale a pena seguir adiante, a autoajuda, “onde estou errando?”,
vem mil coisas. Mas algo vai fazer vencer todos esses questionamentos: a
paixão. Mais, o amor.
Depois de breve vacilo em que se quer jogar tudo pro alto, a
fita volta na cabeça. O dia em que se conheceram, os primeiros olhares, as
primeiras palavras e a empatia. Vem o primeiro beijo, a primeira alegria e, por
fim, o dia em que se achou que seria para sempre. Vem o dia do casamento, o
juramento para o padre. Pausa para a lua de mel, aquela alegria que parece sem
fim. A primeira dificuldade e o cônjuge ao lado. Depois a segunda, a terceira,
a última e a fita chega ao fim. Há mais o que acontecer. Vale a pena que
aconteça? Se depois do filme todo o amor existe, o casamento continua e aquilo
é apenas um mau episódio. E estamos falando de casamentos interpessoais. E os
casamentos figurados como o terminado pelo Clovis Rossi?
Apesar das peculiaridades não diferem em nada. Quando
escolhi meu time, o namoro não começou nada bem. Foram anos sem alegria
absolutamente nenhuma. Pelo contrário. Alegria, nesse começo, era sofrer pouco.
Segurei firme as pontas. Não seria honesto terminar. A situação não melhorava.
Outros casamentos prosperavam e o meu nada. Quase vinte anos de muito pesar.
Foi quando o jogo começou a virar. Meu time passou a me dar uma alegria aqui
outra lá. Começava, finalmente, valer a pena essa casamento. Não foi um mar de
rosas. Mas eu não trocaria. Não terminaria por nada. Afinal, o futebol, como as
relações, nasce de empatia e vive de paixão. Permite eventuais adultérios desde
que se assumam adultérios para todos os envolvidos. Já quis bem algum outro
time eventualmente, mas deixando claro que jamais trocaria o meu por ele. Era
uma noite e nada mais. E vamos eu e meu time chegando aos trinta anos de
relacionamento. Sou casado? Pode ser. Retiro o que escrevi antes
Por isso, meu caro Clovis Rossi, malgrado o respeito que lhe
guardo enquanto jornalista e tendo ideia de como é a dor de ver seu time tão mal,
numa situação tão lastimável que o empurra ao andar de baixo atrevo-me a
aconselhá-lo que nem mesmo um rebaixamento (muito menos mais um) pode ter força
o bastante pra romper seu casamento. Concluo, como quem vê de fora (e
normalmente são os que veem com mais lucidez a situação toda), que não houve
amor entre você e o Palmeiras, mas uma paixão provisória que durou todo esse
tempo. Uma hora acabaria como acabou. Mas vida que segue. Ainda há tempo para
viver um novo amor. Apaixone-se, deixe-se seduzir por algum time. Pode ser pelo
Palmeiras mesmo. Quem sabe, na dificuldade de agora que as coisas não se
resolvem? Basta se permitir que aconteça. Mas nunca se esqueça disso.
Casamentos não são felizes o tempo todo. Muito menos o com nosso time do
coração.
Francisco Libânio,
19/11/12, 11:24 PM
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