Feio demais...
Porque festa de aniversário sem presente não é festa, não é?
O aniversariante já festeja dezessete primaveras, a infância já era e a sanha
por presentes devia ter arrefecido? De
acordo, mas é aquilo: certas infâncias parecem tardar e a de Wesley olha só, é
uma delas. E adolescência é uma transição complicada. Os pais concordaram em
ser a primeira festa com bebida, mas só cerveja. Nenhum destilado. Os
brigadeiros e cachorros-quentes, consenso, ninguém quis deixar de lado.
- Ano que vem, com a
maioridade, acaba. Esse ano não! – sentenciou o aniversariante ao ser
consultado sobre.
Quanto aos presentes, desses não abriu mão. Os amigos trouxeram
DVDs, bonequinhos (“São action figures!” explicava se defendendo da pergunta se
não era velho pra isso). Os tios deram roupas. Um deu um relógio e outro um
livro. A madrinha lhe deu um par de congas. Exatamente, congas.
É preciso explicar aqui que a madrinha não via seu afilhado
há muitos anos. Morava noutra cidade e raramente visitava o menino a quem pegou
no colo na Igreja. Dos gostos do rapaz sabia pouco – ou nada. Queria compensar
sendo mais presente agora que se mudara. Sendo assim, um par de tênis ia ficar
muito bem dado e uma forma de agradar. O problema, óbvio, é que não agradou.
O sorriso amarelo de Wesley foi visto pela madrinha como um
agradado agradecimento. Madrinhas, às vezes, são meio bobas. Principalmente as
que não conhecem seus afilhados. E também, no caso dessa, omissas com o
contexto. Deu o presente, um beijo no afilhado, desejou felicidades, saúde,
amor e foi ficar com os mais velhos.
- Vou deixar meu afilhadinho com os amiguinhos curtindo a
festa enquanto fico lá com os outros. Aproveita e juízo. – explicou. Mas o
estrago estava feito. Os amigos, ao ver o conga na caixa, novinho (onde essa
mulher achou isso, meu Deus?), não pouparam o aniversariante e nem respeitaram
o dia especial. Adolescentes são maldosos.
- Ei, Wesley, calça aí pra ver como ficou!
- Vai com ele na escola segunda pro resto da turma ver!
- Ai, que lindinho, o menininho da madrinha!
- Péra, que eu já tô subindo isso pro Youtube.
Quem estava curtindo cerveja na festa deixou a bebida
esquentar pra ferver a cabeça do amigo. Cachorro-quente nenhum era mais gostoso
que a gozação desbragada com as lindas congas azuizinhas do Wesley. Alguém
tinha sugerido, antes do fato, um grande campeonato de videogame. Nem se falou
mais nisso.
Mas como depois da queda sempre tem o coice, quem apareceu
pra ver o presente que a madrinha deu foram os pais do Wesley, muito felizes
com a reaproximação da madrinha, amiga da família, e o filho mais velho deles.
O que foi encarado como troça vindo dos amigos virou ordem de delegado vindo
dos pais. Eles queriam ver como ficou o calçado no filho e qual remédio senão
calçar? Celulares a postos, o grande momento foi registrado. E Wesley calçando
as congas, os pais avaliando se o tênis não está pegando e o inevitável e
esperado desfile pra ver se ficou bom virou filme. A vitória dos amigos era
inconteste. Wesley estava batido e estaria liquidado segunda feira, na escola.
Segunda-feira? Amanhã, a Internet teria uma enxurrada de mesmos vídeos. Vários
wesleys calçando congas ridículas. A autoafirmação semi-impúbere venceria sobre
ele. Não culpava a madrinha, que nem o conhecia, pelo presente. Mas se soubesse
em qual loja ela encontrou aquela monstruosidade, tocaria fogo se fosse
desequilibrado. Vender conga em pleno século XXI, onde um espirro mal dado ganha
curtidas e views em minutos era a certeza de traumas.
No entanto, deve ter sido Deus, Jesus e todos os santos que
mandaram Roberta chegar àquela hora, quando a piada estava digerida e a conga
era novidade, pra ela. E deve ter sido todos eles que a mandaram dizer:
- Nossa, Wesley, que fofo esse sapatinho! Super bonitinho,
super meigo!
E nem que o “meigo” fosse a gozação extra para aqueles meninos
sedentos por virilidade própria a quem uma palavra a ameaçasse, Wesley não deu
por isso. Nem por nada mais. A menina por quem ele nutria uma disfarçada paixão
gostou do que viu. Seus amigos, esses traíras que vem comer e beber às suas custas
para, ainda, abusar de uma demonstração familiar de afeto não mereciam a
recepção que tinham nessa casa. Não ia se rebaixar ao nível desses canalhas
safados que não têm uma madrinha capaz de acertar tão em cheio num presente.
Bando de infelizes. Cerveja nenhuma desceu melhor que o elogio de Roberta e
cachorro-quente nenhum foi mais gostoso que o beijo que ganhou dela. A festa,
com conga e tudo, valeu a pena.
Francisco Libânio,
22/04/13, 9:27 PM
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