Foi ele! Quer dizer...
Foi um crime barbaríssimo. Horrendo! Só que foi um crime,
até àquela altura das investigações, perfeito. O delegado que estava no local
não achava impressões digitais, evidências, provas. Apenas o de-cujus esfriando a cada instante. Não
houve testemunhas. O safado escolheu um momento deserto para apagar seu
oponente, e o fez sem que ninguém soubesse. Os presentes eram curiosos, mas
ninguém viu nada. Foi quando um dos policiais se chegou ao delegado e
sussurrou:
- Tem um moço aí dizendo que viu tudo. Quer falar com o
senhor.
O delegado foi ter com o cidadão. Sujeito típico “cidadão de
bem”, insuspeito de tudo. O delegado foi direto às falas:
- Me falaram que você sabe quem cometeu o homicídio. Pois
diga!
- Digo, sim – disse ele – Digo porque vi com esses olhos que
a terra há de comer. E porque eu conheço o desgraçado que matou o presunto aí.
É o maior pilantra da face da Terra. Meu inimigo declarado. Sou de boa paz,
amigo da humanidade, mas esse... Se o Diabo bater na minha porta atrás dele,
sirvo cafezinho e embrulho o homem pra presente.
- Mas eu não sou o Diabo, meu amigo. Olha que te prendo por
desacato. – irritou-se o delegado.
- Longe de mim, senhor. Sou amigo da Lei. Mas esse faço
questão de entregar. Ele nunca imagina que eu assistiria ao crime de camarote.
- Pois se assistiu, me conta o filme. E logo, que eu não tô
pra conversa! – apressou.
- Então, doutor. O sujeito, ele é, mais ou menos da minha
altura. Tem cabelo preto e é gordo. Um leitão, um porco fedido.
- Sua altura e gordo. Cabelo preto. O que mais?
- O cara trabalha numa serralheria aqui perto. O homem
maneja uma serra com muita destreza, isso eu tenho que admitir. Nesse negócio,
pode ser um grande nó-cego, mas é um artista de mão cheia. Se não fosse tão
safado...
- E por que vocês são inimigos? De onde vem essa briga? – o
delegado e a perícia notaram que a arma do crime era uma serra sem impressões.
O corpo estava retalhado. Praticamente um boi pra açougue.
- Porque eu fiz uma encomenda com ele e o safado me pediu
adiantado dizendo que era um trabalho grande, que precisava de um sinal. Dei o
sinal e ele falou que, já que estava fácil assim, queria o pagamento completo,
mas que eu não me arrependeria. No dia combinado, até antes, as peças estariam
na minha casa. Nunca chegaram, doutor. Se não fosse minha esposa, eu teria ido
até lá e metido a mão na cara dele. Me roubou.
- Quanto tempo isso?
- Uns cinco meses. Fui pedir meu dinheiro de volta, mas com
a mulher pra não entrar em confusão. Ele disse que dinheiro pago é dinheiro
pago e que eu tivesse paciência e não enchesse o saco ou ele não faria era
nada. Disse que ele enfiasse o dinheiro naquele lugar e que isso não ia ficar
assim. Eu falo que o Destino é cruel com os safados. Olha aí.
- E o que ele vestia no momento do crime?
- Ah, doutor, aí o senhor me apertou sem abraçar. Não
lembro. Era alguma coisa entre verde e violeta, sabe? Não lembro. A descrição
que era ele eu sei porque a silhueta bate muito com a dele. Só tem um gordo
daquele jeito. E que mexe com serra então. Certeza que foi ele, só não lembro o
que ele vestia.
O delegado agradeceu a ajuda. Já era alguma coisa, melhor do
que nada. Anotou onde era a serralheria em que o suspeito trabalhava e
dispensou o delator. Nesse momento, o policial chamou o delegado de novo.
Parece que havia outro delator. Confirmou que o assassino era gordo, de altura
tal que batia com a do outro, tinha cabelos prestos e vestia, sim, verde. O
delegado coçou a cabeça e mandou o policial pegar o outro, que ainda estava
próximo à cena. Trazido de volta, o delegado perguntou à segunda testemunha:
- Você conhece esse homem?
- Sim. Ele é o serralheiro escroque que me fintou uma grana
e não me entregou uma cadeira.
- Ele vestia algo dessa cor?
- Exatamente o que está vestindo agora!
- Mas vocês disseram que ele tinha cabelo preto e esse aqui é
loiro?
- Minha mulher é cabelereira e ontem disse ter recebido um
cliente pra pintar o cabelo. Só não imaginava que ela fosse tratar, justamente,
do meu maior inimigo! E nem que além de nó cego, ele fosse assassino também.
Por favor, delegado, ela não tem nada a ver com o peixe, mas quando eu chegar
em casa, vou ter uma conversa séria e ela vai escolher melhor os seus clientes.
Francisco Libânio,
15/02/14, 2:09 PM
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