O primeiro gol contra a gente.
Hoje teve o jogo entre a poderosa seleção da Espanha,
campeã do mundo, da Europa e cheia de craques contra a modestíssima seleção do
Taiti, que nunca participou de uma Copa do Mundo e está nessa Copa das
Confederações mais parecendo um penetra de luxo que um legítimo campeão
continental que de fato é. Na primeira partida, a Espanha esbanjou categoria e
ganhou de uma boa seleção uruguaia. O Taiti, apoiado pelo povo, perdeu
portentosamente para uma Nigéria desfalcada e longe dos esquadrões que já
montou a ponto de ser favorita a ganhar mundiais. Porém, o Taiti fez um gol e
levou uma massa brasileira, que nada ou pouco conhecia sobre o território
francês, a um arroubo de felicidade. Para o segundo jogo, o técnico taitiano
mandou ingressos para crianças de comunidades do Rio. Definitivamente, o Taiti
conquistou os brasileiros.
Não vou me demorar sobre a atitude vista como benevolente ou
populista do treinador. Prefiro me ater ao time e tentar entender tamanha
empatia, muito anterior ao presente às crianças. De onde isso vem? Como uma
ilhota no Pacífico sem história alguma no futebol conquista uma das academias
do esporte? É preciso colocar aqui o que a essa altura já se sabe bem. A
seleção taitiana é composta quase toda por amadores. São diversas profissões,
um bancário, um alpinista, um professor, um desempregado... Apenas um jogador é
profissional e atua num time pequeno de uma liga menor europeia, é menos afeito
aos holofotes e grandes mídias. Muda pouca coisa. Esse grupo de homens se viu
hoje num dos templos mais caros ao futebol contra uma equipe de ídolos, astros
em times cosmopolitas e respeitados e temidos mesmo por outros grandes ídolos. O
desnível da partida foi pra lá de flagrante. A goleada foi previsível e mesmo
assim, os taitianos saíram aplaudidos de campo. Por quê?
Porque o Taiti nada mais é que nós, pessoas comuns, num evento
em que todos que sonhamos um dia ser jogador de futebol – e não realizamos –
gostaríamos de estar. Porque os taitianos, mesmo longes das cifras infindas que
correm no mundo do futebol, estão, em tese e em utopia, em pé de igualdade com
quem frequenta esse mundo. Porque o futebol da nossa realidade cotidiana, jogado
em campinhos entre os com-camisa e os sem-camisa está, durante aqueles noventa
minutos, pareado com os profissionais que treinam diariamente e se cuidam com
os melhores profissionais para reembolsar aos clubes todo o grosso investimento
neles. E o nosso maior desejo, nossa inalcançável fantasia era que o Taiti
guardasse um, dois gols na Espanha e se segurasse com toda a alma velando seu
sucesso. Nunca aconteceria, mas que bom seria se acontecesse. Por isso, o gol
do Taiti no jogo passado foi um gol nosso. Não um gol do Brasil do Neymar, mas
um gol do brasileiro que foi bater uma bolinha depois do expediente.
Todos sabemos que praticar um esporte faz bem à saúde, mas
cada vez mais se vê que o esporte, principalmente o futebol, nos níveis
competitivos de hoje agride o corpo, às vezes de forma irreversível. Hoje o
esporte é menos saúde e mais negócio. O futebol deixou de ser diversão e virou
commoditie, Quem ganha o seu brincando de futebol embolsa mais que muita gente que
joga bola com os amigos pra comemorar o salário do mês. Junta! É errado? Na
mentalidade atual não, já que o futebol é uma paixão mercantilizada. Nós mesmos
fizemos o futebol virar a mina de ouro que transformou a Espanha na potência
que nos goleou enquanto taitianos que fomos hoje e que mais dia menos dia se
transformará nesses profissionais que enfrentaram. Somos culpados, mas no fundo
queríamos que o mundo do futebol fosse como o Taiti, descompromissado,
inocente, divertido. Como nós ao escolher os times.
Francisco Libânio,
20/06/13, 5:06 PM
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